A ISO 45003 é a primeira norma internacional voltada exclusivamente para a gestão de riscos psicossociais no ambiente de trabalho, sendo uma extensão da ISO 45001, fornecendo diretrizes específicas para identificar, prevenir e gerenciar riscos psicossociais.
A norma define risco psicossocial como 'a combinação da probabilidade de ocorrência de exposição a riscos de natureza psicossocial relacionados com o trabalho e a gravidade da lesão e deterioração da saúde que esses riscos podem causar'.
Isso reforça a necessidade de tratar os fatores psicossociais com a mesma seriedade com que se lida com riscos físicos e químicos. A análise de risco deve considerar tanto a frequência da exposição quanto a gravidade dos possíveis efeitos na saúde.
A ISO 45003 também propõe o conceito de bem-estar no trabalho, que vai além da ausência de doenças. Trata-se de atender às necessidades e expectativas físicas, mentais, sociais e cognitivas dos trabalhadores.
Isso inclui desde a organização das jornadas de trabalho até a qualidade das relações sociais, passando por aspectos como o reconhecimento, a comunicação e a sensação de pertencimento. Quando o bem-estar é priorizado, ele impacta positivamente inclusive a qualidade de vida fora do trabalho.
A norma apresenta uma estrutura clara para auxiliar na identificação dos perigos psicossociais. O item 6.1.2.1 - Identificação de Perigos destaca três áreas essenciais que devem ser observadas:
A forma como o trabalho é planejado e distribuído pode gerar conflitos e sobrecargas. Exemplos citados na ISO incluem:
Expectativas contraditórias em uma mesma função (como oferecer atendimento de qualidade sem gastar tempo com o cliente).
Alterações frequentes nas regras e tarefas, gerando insegurança.
Trabalho repetitivo, fragmentado ou percebido como sem sentido.
Exigência constante de alerta e concentração elevada.
Altos níveis de pressão por prazos curtos.
Essas situações minam a autonomia e o senso de propósito dos trabalhadores, levando à exaustão mental e física.
O clima relacional dentro da organização também é um fator crítico. A norma destaca:
Falta de canais eficazes para escutar reclamações e sugestões.
Retenção de informações que deveriam ser compartilhadas.
Ausência de feedback construtivo.
Relações baseadas na desconfiança, desrespeito, injustiça ou falta de civilidade.
Ambientes marcados por conflitos interpessoais, assédio moral ou falta de reconhecimento são grandes geradores de sofrimento psíquico.
Mesmo fatores aparentemente físicos podem ter implicações psicossociais:
Espaços mal planejados, iluminação deficiente ou ruído excessivo.
Falta de recursos adequados para a realização das tarefas.
Exposição a ambientes extremos (calor, frio, altura), que geram constante tensão e sensação de insegurança.
Ambientes mal estruturados comprometem tanto a saúde física quanto o bem-estar psicológico dos trabalhadores.
A liderança exerce influência direta sobre o clima psicossocial. Líderes mal preparados podem gerar ou amplificar riscos. Já líderes empáticos, que promovem escuta ativa, transparência e valorização, atuam como fatores protetores.
Além disso, a cultura organizacional deve valorizar o bem-estar, promovendo um ambiente seguro para que os trabalhadores expressem dificuldades sem medo de retaliação. Isso fortalece a confiança e facilita a identificação precoce de problemas.
A ISO 45003 propõe um conjunto de ações para prevenção e mitigação dos riscos psicossociais, como:
Redefinir cargas de trabalho e prazos para evitar sobrecarga e burnout.
Estimular uma cultura de comunicação aberta e respeitosa.
Treinar lideranças para identificar sinais de estresse e sofrimento emocional.
Promover suporte psicológico para quem enfrenta dificuldades.
Garantir espaços de escuta, reconhecimento e valorização do trabalho.
Estabelecer políticas claras contra assédio, discriminação e outras formas de violência psicológica.
Essas medidas devem estar integradas ao Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e ao Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), conforme estabelecido pelas normas NR-01 e NR-17 do Ministério do Trabalho e Emprego.
Empresas que implementam uma gestão eficaz dos riscos psicossociais percebem impactos positivos em várias dimensões. Há um aumento significativo no engajamento e na motivação dos colaboradores, criando um ambiente mais produtivo e colaborativo.
A redução das faltas e dos afastamentos é um reflexo direto do cuidado com a saúde mental, assim como a elevação dos níveis de criatividade e desempenho. Além disso, organizações que priorizam o bem-estar tendem a reter mais talentos, já que os trabalhadores se sentem valorizados e protegidos.
A reputação institucional também é fortalecida, tanto no mercado quanto entre os próprios funcionários, demonstrando compromisso com práticas responsáveis e humanas.
Por fim, a conformidade com as normas legais e internacionais é garantida, o que evita passivos trabalhistas e reforça a sustentabilidade da gestão. Ambientes emocionalmente seguros se tornam verdadeiros catalisadores de inovação, fortalecendo a confiança, a colaboração e o senso de propósito coletivo.
Identificar riscos psicossociais envolve perceber mudanças sutis (ou nem tão sutis) nos comportamentos e indicadores organizacionais. Fique atento a:
Aumento de faltas, atrasos e afastamentos.
Queixas frequentes de estresse, ansiedade ou fadiga.
Queda na produtividade ou qualidade do trabalho.
Turnover elevado.
Reclamações sobre liderança ou ambiente.
Apatia ou desmotivação generalizada.
Dificuldade de concentração e erros recorrentes.
Esses sinais são importantes fontes de dados para avaliação dos riscos psicossociais.
A ISO 45003 dá ênfase à prevenção primária, ou seja, às ações voltadas para evitar que os riscos psicossociais se desenvolvam no ambiente de trabalho. Isso exige uma abordagem proativa por parte das organizações, que devem investir em um planejamento adequado da carga de trabalho, promovendo equilíbrio entre as demandas e os recursos disponíveis.
Também é fundamental fortalecer a comunicação interna, garantindo que informações relevantes circulem de forma clara e acessível a todos.
O preparo das lideranças é outro pilar essencial, com treinamentos voltados para gestão emocional, resolução de conflitos e apoio às equipes. Além disso, a promoção da diversidade, equidade e inclusão contribui para ambientes mais justos e respeitosos.
Políticas institucionais que valorizem a dignidade no trabalho, aliadas a estruturas de apoio psicológico e de saúde ocupacional, completam essa estratégia preventiva.
Adotar essas medidas desde o início é não apenas mais eficaz, mas também mais econômico do que remediar os efeitos de problemas já instalados, como burnout, adoecimento mental e afastamentos prolongados.
A identificação de riscos psicossociais é um passo essencial para promover ambientes de trabalho saudáveis, produtivos e seguros. A ISO 45003 oferece uma abordagem estruturada e prática para integrar essa dimensão à gestão organizacional.
Empresas que adotam essas diretrizes não apenas cumprem com obrigações legais e normativas, mas também investem na qualidade de vida, engajamento e desempenho de seus colaboradores. Ao reconhecer os riscos psicossociais e agir preventivamente, as organizações constroem uma cultura de cuidado, confiança e sustentabilidade.
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