A saúde mental no ambiente de trabalho é um tema que tem ganhado cada vez mais relevância nos últimos anos, especialmente com a atualização das diretrizes da NR-01, que passou a exigir a identificação e avaliação dos riscos psicossociais. No entanto, ainda é comum observar confusões conceituais quando falamos sobre esse tipo de risco, especialmente na hora de diferenciar o que é um fator psicossocial (perigo), o que representa um risco e o que se caracteriza como uma consequência.
Neste artigo, vamos esclarecer esses conceitos de forma clara e prática, relacionando-os com situações reais do cotidiano corporativo, além de discutir as implicações da sua correta identificação dentro da Gestão de Riscos Ocupacionais (GRO) e do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR). Também apresentaremos exemplos e medidas de controle eficazes para promover um ambiente de trabalho mais saudável.
Para compreender os riscos psicossociais, é necessário entender a estrutura lógica entre três elementos fundamentais:
Perigo (Fator): é o elemento presente no ambiente de trabalho que pode originar um risco. É algo que faz parte da rotina ou da cultura da organização e que, isoladamente ou em conjunto com outros elementos, pode influenciar negativamente os trabalhadores.
Risco: é a probabilidade de que esse perigo cause um dano à saúde física ou mental do trabalhador. Trata-se de uma possibilidade, algo que pode ou não ocorrer, mas que deve ser considerado no processo de avaliação.
Consequência: é o impacto direto da exposição ao risco. Ou seja, é o efeito negativo que se manifesta após certo tempo de convivência com aquele fator de risco, podendo afetar a saúde, o comportamento e até mesmo o desempenho profissional.
A confusão entre esses três conceitos pode comprometer a avaliação de riscos no PGR e resultar em medidas de controle ineficazes. Por exemplo, dizer que “ansiedade é um risco psicossocial” é um erro conceitual. Na verdade, a ansiedade é uma consequência de fatores e riscos psicossociais mal gerenciados, como excesso de cobranças, pressão constante ou falta de reconhecimento.
Quando os perigos são corretamente identificados, é possível intervir de forma mais eficaz, com ações direcionadas e estratégicas. Isso favorece a criação de ambientes mais saudáveis e sustentáveis, melhora o clima organizacional e reduz o absenteísmo, a rotatividade e os afastamentos por doenças relacionadas ao trabalho.
Para ilustrar como perigos, riscos e consequências se relacionam, veja alguns exemplos:
1. Comparando e exemplificando Riscos Físicos e Psicossociais
Perceba que, assim como nos riscos físicos, os psicossociais seguem uma lógica causal: perigo (fator) → risco → consequência. A diferença está na natureza dos efeitos, que são majoritariamente emocionais, comportamentais e psicológicos.
2. Exemplo Avançado de Estruturação no Inventário de Riscos
Esse nível de detalhamento é fundamental para dar legitimidade ao PGR e gerar evidências que sustentem o plano de ação junto à alta gestão.
A NR-01 exige que a empresa identifique, avalie e controle todos os riscos ocupacionais, incluindo os psicossociais. Para isso, é essencial incorporar instrumentos adequados, como:
Identificação de Fatores: pode ser feita por meio de metodologias validadas cientificamente, que permite mapear dimensões como exigências emocionais, previsibilidade, apoio social, reconhecimento, entre outros.
Entrevistas e observações, que ajudam a captar fatores que não aparecem em documentos formais;
Mapeamento participativo, envolvendo os trabalhadores na identificação de riscos e sugestões de melhorias.
Avaliação do Risco e indicadores organizacionais: envolve a interpretação dos dados obtidos, associando-os a indicadores de saúde organizacional, como absenteísmo, rotatividade, queixas em prontuários, afastamentos por CID F, etc.
Classificação da Gravidade: deve considerar o impacto sobre a saúde do trabalhador e sobre os indicadores de produtividade. Exposição a fatores como “conflito de valores” ou “insegurança quanto ao futuro” pode gerar danos sistêmicos à cultura organizacional.
Plano de Ação: as medidas de controle devem ir além da sensibilização. É necessário redesenhar processos, rever práticas de liderança e integrar programas de saúde mental ao sistema de gestão.
Ao identificar um risco psicossocial, é importante pensar em medidas que atuem tanto na causa quanto no efeito. Algumas estratégias incluem:
Redesenho de tarefas e melhoria do equilíbrio entre demandas e recursos;
Treinamento de lideranças para uma gestão mais humanizada;
Estímulo à comunicação aberta e ao feedback construtivo;
Valorização do trabalho e reconhecimento dos colaboradores;
Promoção de programas de saúde mental e bem-estar.
O COPSOQ III é uma ferramenta internacionalmente reconhecida e cientificamente validada para mensurar fatores psicossociais. Ele oferece:
107 itens (versão longa) organizados em 31 dimensões;
Avaliação de exigências laborais, relações sociais, liderança, cultura organizacional e sentido do trabalho;
Classificação por cores e faixas de risco, permitindo leitura rápida por parte da gestão;
Aplicação digital, com relatórios comparativos e tendências históricas.
Ao aplicar o COPSOQ, é possível quantificar de forma objetiva os fatores psicossociais, transformando um tema subjetivo em dados estratégicos para tomada de decisão.
Organizações que incluem os riscos psicossociais em seus sistemas de gestão se destacam por:
Reduzir custos com afastamentos e turnover;
Melhorar o engajamento e o desempenho da equipe;
Fortalecer a imagem institucional perante investidores, clientes e talentos;
Estar em conformidade com legislações nacionais e internacionais como a NR-01, ISO 45003 e ESG.
A transição de um modelo reativo para uma abordagem preventiva e estratégica requer investimento — mas o retorno é amplamente mensurável em termos de sustentabilidade organizacional.
A correta diferenciação entre perigo, risco e consequência é a base para uma gestão eficiente dos riscos psicossociais no trabalho. Mais do que uma exigência normativa, essa compreensão permite ações preventivas assertivas, melhora o clima organizacional e contribui diretamente para a saúde mental e a produtividade dos colaboradores.
Empresas que investem na saúde psicológica do seu time não apenas cumprem a legislação, mas constroem ambientes mais saudáveis, éticos e sustentáveis — onde as pessoas desejam permanecer e crescer.
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